"Eu, porém, vos digo que não resistais ao mal; mas, se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra" - Mateus, 5:39
Naturalmente, não podemos levar ao pé da letra essa recomendação do Nazareno, mesmo porque, uma quase nula parte da Terra conseguiria seguir este ensinamento. Qual de nós, ao sentir a dor de um bofetão na face, instantaneamente se resignaria em oferecer a outra? Pessoas comuns que somos, ninguém. Os verdadeiros santos e missionários talvez, mas de pouco adiantaria uma lei que raros conseguissem seguir. Deve-se portanto observar esta instrução num sentido mais amplo, o de não se revoltar inutilmente contra algo que não depende de você, e apenas contornar esse algo. Ou mais: se uma iniciativa boa e justa lhe levou a uma rasteira, não ceda ao mal desistindo de tentar de novo, persista, e dê a face de uma nova tentativa, mesmo correndo o risco de cair novamente. Jesus desejava nos ensinar sobre uma das sete leis que regem a vida: A Lei da não resistência.
Pode parecer uma grande contradição, mas quem não resiste ao mal, pode vencê-lo.
Um claro exemplo disso é a água, que os chineses consideram o mais poderoso dentre todos os elementos, pois a água é moldável, flexível, não opõe resistência quando encontra uma barreira, ou um “mal” no seu caminho. Ela o contorna, se moldando às possibilidades, e segue seu caminho. E por que ela é poderosa por ter esse comportamento? Porque contornando todos os obstáculos, chega ao mar e se torna maior, podendo arrebentar muralhas e arrastar tudo o que encontrar pela frente.
Isso não significa que devamos adotar uma postura de passividade e conformismo na vida. O que pode ser evitado, que assim o seja, e muitos são os convites para lutarmos bons combates. O que pode ser enfrentado e removido do caminho, assim o deve ser. Mas há elementos na estrada que são além de nosso controle. Do que adianta resistir? Uma vez deflagrado um fruto verde, em vão tentaremos fechá-lo novamente até que amadureça. Há portanto de se compreender que o "não resistais ao mal" tem um vínculo direto com o não desejar controlar o que não está sob o nosso controle, mas sim agirmos como a água, contornando rochas e desviando de obstáculos para seguir o caminho possível até o mar, quando se torna uma das potências mais avassaladoras - e ao mesmo tempo encantadoras - da natureza.
"A Lei da não-resistência é um princípio espiritual por meio do qual podeis harmonizar-vos com todos os obstáculos e oposições, mudando-os em elementos de progresso e aperfeiçoamento".
Quando Jesus Cristo disse: “Não resistais ao mal”, Ele na verdade sabia que não existe mal, e, portanto, nada a que se deva resistir.
Mas e as calamidades, injúrias, injustiças, difamações, e tantas outras coisas que surgem sob o estigma do mal? Nada mais do que fruto de nossa necessidade de aprimoramento, de nos adaptarmos ao obstáculo – ou “ao mal” – e contorná-lo.
Um grande amigo a quem admiro muito, sempre tem o hábito de dizer: “A vida só coloca diante de nós um professor ou um aluno; ou estamos ali para ensinar, ou estamos ali para aprender”.
E quando aprendemos, a lição cessa, e aquilo que chamamos de mal, desaparece. Portanto, ele nunca existiu de fato; o que existe é a nossa resistência que nos ilude, fazendo-nos crer que algo é pior do que realmente parece ser. Se desviar de uma bala é melhor do que abrir o peito e querer enfrentá-la.
Se agirmos como a água e nos desviarmos dos obstáculos, das barreiras, e de tudo o que impede de seguir por aquele caminho, bastará dar a volta. “A outra face” que se dá, é a face da humildade em aceitar sem revolta que basta darmos alguns passos a mais, e teremos contornado aquela rocha imensa. Caso contrário, seríamos severamente feridos tentando insistentemente destruí-la com os próprios punhos.
Não resista ao mal. Contorne-o. Você perceberá um prazer indescritível em não resistir ao que pode simplesmente contornado. Uma paz espetacular tomará conta de você, e uma grande quantidade de energia será poupada para atos mais proveitosos na vida.
E mais: ao dar a volta, pode ser que você descubra belezas escondidas no caminho que de outra forma, jamais seriam admiradas pelos seus olhos, ou sorvidas pela sua alma. É fácil fazer isso? Nem sempre. Mas é recompensador.
Se você tentou destruir vários dos obstáculos – ou males – do seu caminho até aqui, e se machucou em maior ou menor grau diante daqueles mais difíceis, nos próximos que surgirem, tente apenas dar a volta. Acredite: Ganha-se uma paz indescritível quando se consegue.
Pense nisso!
Autor: Antony Valentim